terça-feira, 3 de janeiro de 2017

Vila Viçosa - Património Mundial?

Passados mais de 40 anos sobre as primeiras classificações de bens patrimoniais efetuadas pela UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação Ciência e Cultura), Portugal encontra-se entre os 15 países deste organismo que lideram a lista do Património Mundial. Portugal é um dos países com maior número de monumentos no mundo classificados como Património Mundial, o que demonstra a amplitude da sua atuação mundial.
Os monumentos portugueses podem ser encontrados por todo o mundo, o que mostra bem a dimensão e influência da presença portuguesa a uma escala global. Do Brasil à Tanzânia, do Paraguai ao Sri Lanka, os portugueses deixaram marcas culturais e de enorme valor, classificadas oficialmente pela UNESCO em três continentes diferentes.
De facto, e no contexto europeu, apenas países como a Espanha, a Itália e a França, que detém os “recordes” das classificações de Património Mundial, se encontram numa situação privilegiada em relação ao caso português. Poderá o Alentejo contribuir de forma mais significativa para a listagem de locais com elevado interesse cultural classificados pela UNESCO?

Portugal, contexto de referência em termos de Património Mundial.

 Relativamente ao nosso país, a primeira avaliação efectuada pela UNESCO ocorreu em 1983 e incidiu na categoria de bens culturais, tendo sido atribuídas as classificações de Património Mundial ao Convento de Cristo em Tomar, ao Mosteiro da Batalha, ao Mosteiro dos Jerónimos/ Torre de Belém e ao Centro Histórico de Angra do Heroísmo, nos Açores. Em 1986, é incluída a cidade de Évora, em 1989, o Mosteiro de Alcobaça, em 1995, a Paisagem Cultural de Sintra, em 1996, o Centro Histórico do Porto, em 1998, a Arte Rupestre do Vale do Côa, em 1999, a floresta de Lauráceas na Ilha da Madeira, e, em 2001, o Centro Histórico de Guimarães e a região vitícola do Vale do Côa.  A Paisagem de Cultura da Vinha na Ilha do Pico foi classificada no ano de 2004.
Mais recentemente e no Alentejo, temos os casos de Elvas e do Cante, assim como da Arte Chocalheira, a nível do Património Imaterial.
Todos estes processos de candidatura foram caracterizados pelo cumprimento de um conjunto de requisitos, que passaram por intervenções de conservação e restauro em áreas onde a degradação era mais evidente e por uma fundamentação científica muito rigorosa. 
 Contudo, a lista de locais com esta atribuição por parte da UNESCO poderá aumentar a médio prazo, dada a proliferação de candidaturas, muitas vezes apresentadas sem a devida fundamentação científica.


Vila Viçosa, berço de Florbela e de Pousão...

O caso específico de Vila Viçosa, a “princesa do Alentejo”, local de enorme beleza e elevado valor patrimonial, encontra-se neste momento numa situação de enorme expectativa, na medida em que estão a ser retomadas as actividades relacionadas com a actualização documental da candidatura. 

Foi constituída em 2004 uma Comissão de Honra disponível para apoiar o município calipolense,  e que engloba “personalidades de referência no panorama cultural português”, entre as quais se destacam os Arquitectos Manuel Lapão e Nuno Portas e o Dr. Joaquim Saial, estando o processo de pré-candidatura já concluído.

A Câmara Municipal de Vila Viçosa surge como a entidade coordenadora do processo de candidatura, em colaboração com instituições como o Grupo “Amigos de Vila Viçosa”, a Santa Casa da Misericórdia, o Arcebispado de Évora e a Fundação da Casa de Bragança.

Com o objectivo de proceder à fundamentação científica da candidatura calipolense foram sido concretizados diversos eventos de índole cultural, nomeadamente a realização das “Jornadas do Património”, em Novembro de 2003 e as “Jornadas de História”, em 2004,  iniciativas no seio das quais participaram diversos especialistas nacionais e estrangeiros, que procuraram destacar o carácter excepcional de Vila Viçosa e a singularidade do seu património. 
Creio que seria importante dar continuidade a estas conferências de carácter científico, que muito contribuiriam para o desenvolvimento de novas pistas de investigação, suporte essencial em termos documentais para este tipo de iniciativas.

 No entanto, e para que o projecto conhecesse um novo progresso, foi necessária a  indicação da Comissão Nacional da UNESCO para a formulação da lista indicativa de Portugal. Contudo, e de acordo com o novo regulamento da UNESCO, em vigor desde 2001, cada Estado só poderá apresentar uma candidatura por ano. Como consequência, o Estado Português deverá proceder a uma selecção prévia de cada um dos locais indicados por ano. Vila Viçosa já se encontra neste lote de pré-candidatos com potencial para a classificação final.

A candidatura de Vila Viçosa integra-se na categoria do património cultural e englobava, numa primeira fase, o núcleo central da povoação, o qual constitui um exemplo notável de urbanismo, geométrico e erudito, no quadro medievo- renascentista (séculos XV-XVI), onde o mármore assume um papel de destaque. Tratava-se de uma proposta restringida a uma área específica, mais significativa do ponto de vista cultural e assumia deste modo, um carácter sectorial. 
Deverá ser o objecto da proposta alterado? Em 2004 surgiram algumas discrepâncias em relação a esta questão, na medida em que alguns especialistas advogavam que somente o Paço Ducal, o seu conteúdo artístico diversificado e a sua envolvente deveriam integrar o projecto de admissão, enquanto outros defendiam a componente urbana quinhentista de Vila Viçosa no âmbito de um plano mais abrangente. Esta discussão terá que ter continuidade até que se atinga um consenso…

Novo incremento turístico para o Alentejo?

Quais o benefícios decorrentes da eventual aprovação deste projecto? 

Terá Vila Viçosa condições para assumir este desafio? 

Estarão todos os calipolenses unidos em relação a este desígnio? 

As respostas a esta questão poderão assumir contornos importantes, dadas as responsabilidades decorrentes da classificação da UNESCO.
Terão que ser os calipolenses e as instituições locais, a assumir uma estratégia de cooperação e diálogo a este nível…
A definição atribuída por este organismo significa o reconhecimento mundial do valor de um bem cultural e/ou natural e da sua importância para a história da Humanidade. Consequentemente, a introdução de vantagens em relação ao desenvolvimento do turismo e a pressão exercida por diferentes localidades e áreas do país constitui um sinal inequívoco de que a aprovação das candidaturas significa prestígio, receitas financeiras, reconhecimento público e um compromisso para salvar o insubstituível. 
Seria no entanto essencial uma componente educacional junto da população, de modo a sensibilizar os calipolenses para a necessidade de conservação do património. A gestão de todo este processo e a constante actualização de procedimentos e intervenções é  outro vector essencial.
Contudo, a atribuição desta designação por parte da UNESCO implica também obrigações relativamente à preservação do património, o investimento na sua gestão integrada e o envolvimento das populações locais, na medida em que este organismo internacional não entende a lista de património mundial como um mero repositório de troféus. Ao ser atribuída a classificação, cada país e cada município terão que assumir o compromisso para a protecção dos locais designados.
A candidatura de Vila Viçosa implicará, desta forma, um conjunto de alterações significativas relativamente à gestão e preservação do património, no âmbito do qual é imprescindível o envolvimento das populações, segundo os responsáveis. 
Na medida em que os processos de candidatura se assumem sempre como estratégias de valorização, ainda que as propostas referidas não possam adquirir o parecer favorável por parte da UNESCO, os resultados decorrentes da indicação de ambos os locais assumem sempre um carácter positivo, com nota de destaque para a região alentejana nos principais roteiros turísticos do Velho Continente. 
Não querendo, da minha perspectiva, assumir-se como um objectivo em si mesmo, creio que haverá um conjunto de vantagens no desenvolvimento deste projecto, que poderiam valorizar o património calipolense e rentabilizar, do ponto de vista económico, este legado.

  A possibilidade de fruição pelos fluxos turísticos de um número mais abrangente de espaços (nomeadamente o Museu de Arte Sacra da Igreja de Santa Cruz, a abertura da Igreja da Esperança e de Santo António, a nível da pintura mural, a Casa de Fresco do Solar dos Sanches de Baena, os projectos museológicos das Casa de Florbela Espanca e Henrique Pousão, o legado do Pintor-Escultor Espiga Pinto, a reestruturação do Museu do Mármore, entre outros projectos em análise) permitiria uma oferta de qualidade, tendo em conta a importância actual do turismo cultural como fonte de rendimentos.

Aliando métodos de conservação com actividades de divulgação dessa herança, quer a nível nacional, quer a nível internacional, independentemente da decisão que a UNESCO viesse a tomar, Vila Viçosa só ficaria a ganhar…


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